terça-feira, 26 de julho de 2011

VENCER, DE ONDE VEM ESSA FORÇA?

A MÍDIA BUSCA RESSALTAR QUAIS ASPECTOS HÁ NA TRAGETÓRIA DOS CAMPEÕES? ATÉ QUE PONTO O FUTEBOL PODE SERVIR DE EXEMPLO POSITIVO PARA O JOVEM BUSCAR SE APERFEIÇOAR, ESTUDAR?


“Algo gigantesco parecia estar ao lado delas!”, palavras da goleira estadunidense, Hope Solo, que parecia procurar inserir no contexto de sua derrota uma justificativa sobrenatural.

No mesmo embalo da final da Copa do Mundo de futebol feminino, o “Esporte Espetacular” - programa exibido pela Rede Globo - realizou uma reportagem sobre a equipe que sagrou-se campeã do torneio.

Na oportunidade, Roberto Kovalick destacou as condições de trabalho das jogadoras japonesas, enfatizando a jornada dupla de atletas amadoras que apenas encontram tempo para treinar à noite. Contudo, o que mais nos chamou atenção foi a narrativa a respeito dos motivos que moveram a equipe para a grande vitória sobre os EUA...

Seguindo os passos da guarda-redes e musa da Copa, Hope Solo, a reportagem global trouxe como principal justificativa para a façanha a força advinda do nacionalismo, ressaltando a depressão que assola o país em consequências das últimas tragédias.

A vitória das futebolistas japonesas passava a ser explicada  de forma mítica novamente.

De acordo com a reportagem, as grandes, fortes e bem preparadas estadunidenses - EUA que é potência no esporte -, classificadas literalmente como “Golias”, não poderiam ter perdido para as “Davi” do futebol feminino.

A explicação, portanto, para a conquista daquelas atletas amadoras, desconhecidas e franzinas, resumiu-se apenas à força advinda do mito do discurso nacionalista.

Vale lembrar que esse modelo de narrativa é repetida sempre que há oportunidade, já que é através do nacionalismo que se resguardam diversos elementos dos setores mais conservadores da sociedade.

O discurso da nação busca forjar identidades comuns, passa como um trator por cima das diferenças, procurando homogeneizar o máximo possível da diversidade cultural, por sua vez,  privilegiando uns poucos em detrimentos dos demais (sobre isso pode-se ver Stuart Hall, 2001*; Homi Bhabha, 1998* e outros).

No caso específico da reportagem em relação ao feito da equipe japonesa, tal ênfase, relega a outros planos todo o empenho dos últimos anos por parte de diversos homens e mulheres de inúmeras localidades do Japão. Esconde de nossas vistas todo o esforço de décadas, por parte de muitos, para o desenvolvimento do futebol japonês.

Como já dissemos neste blog, desde no mínimo 1992, os japoneses se dedicam a desenvolver a prática futebolística. Um empreendimento de diversos setores do país, desde pequenos investimentos – como o intercâmbio com equipes das categorias de base do Brasil (eu mesmo tive o privilégio de fazer parte de uma delas, no ano de 1992) - até contratações de grandes jogadores profissionais e a promoção de megaeventos - como a Copa do Mundo de 2002, numa parceria com a Coréia do Sul.

O discurso que procura trazer o sobrenatural, o mítico, como elemento principal da conquista nipônica, abafa outro aspecto muito mais decisivo para o feito e, sem dúvida, que poderia ser encarado como muito mais interessante nas análises de nossos meios de comunicação:
O investimento, o treinamento, a dedicação, o empenho, a humildade em reconhecer deficiências e a busca por aprender com os mais experientes.

Destacar tais aspectos seria muito mais importante para incentivar a todos, principalmente os mais jovens ansiosos por vencer numa sociedade competitiva como a que vivemos.

Seria uma excelente oportunidade trazer através da mídia, diante de casos como o da equipe japonesa, a necessidade que todos temos, em qualquer que seja o meio de atuação, de aprender, de se dedicar, de treinar, de estudar.

Preparar-se vale muito mais do que simplesmente acreditar no destino para se chegar ao sucesso, às conquistas. Seja no futebol, seja na música, seja no meio artístico, ou em qualquer outro setor de atividade humana, desempenhar bem sua função é muito mais do que um simples passe de mágica, um dom, um acaso, uma força sobrenatural...

Mas, pode-se facilmente perceber que não é esse o aspecto a ser valorizado. Quando alguém vencedor, de um universo tão fascinante quanto o do futebol, diz algo como a celebre frase de Murici – “Aqui é trabalho, meu filho!” - acaba virando chacota...

Infelizmente, o encantamento é o aspecto mais privilegiado na mídia. Repete-se explicações deste tipo sobre os campeões, sobre os mais reconhecidos e, inevitavelmente, o resultado é a poluição, em grande medida, da mente de jovens promissores.

Vale comparar as palavras de Arthur Antunes Coimbra, o craque Zico, em seu site “ZNR – Zico na Rede” e a reportagem veiculada pela Rede Globo, no programa “Esporte Espetacular”. Pontos de vista muito diferentes sobre os motivos que levaram à vitória das japonesas:




http://www.ziconarede.com.br/portal/znr/colunas.php?pa=1926


* BHABHA, Homi. O Local da Cultura. Belo Horizonte: UFMG, 1998. Ver o capítulo DissemiNAÇÃO.
* HALL, Stuart. A identidade Cultural na Pós-modernidade. 6. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2001.

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