segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Domingo sem "ópio", mas com eleições

Desde o 7 a 1, é muito mais difícil pensar no desenrolar dos acontecimentos políticos do país que nas mazelas profundas do nosso futebol.
Gaviões da Fiel, Pacaembu, 3/4/2016,
no derby contra o Palmeiras. (Luciano Deppa)

Ah, Futebol...

Fenômeno que serve para interpretar o contexto da sociedade, uma espécie de espelho, “metáfora da vida” (salve, professor Hilário Franco Jr.!).

Mas, que também em seu sentido mais primário - e de tão óbvio, nem abordamos tanto tal faceta - o futebol serve para entreter, para dar prazeres, para oferecer “simples” distrações.

Como diziam os acadêmicos marxistas dos anos 1970, “o ópio do povo”. Como diz o jornalista sensacionalistada atualidade, “a coisa mais importante, das desimportantes” (Milton Neves).

E ontem, logo eu, queria apenas isso. Uma distração.

Semelhante ao viciado privado de sua droga, eu, desesperado, fazia o controle remoto ferver na busca por uma mísera partida.

E sim. Eu sabia que não estavam previstos jogos por causa das famigeradas eleições.

Claro que eu sabia que a rodada da série A do Brasileiro, só se completaria na segunda.

A Série B? Sei que a rodada se inicia invariavelmente na terça.

Série D? Eu vi o jogão da final, no sábado! Tinha visto a bela vitória do Volta Redonda – que lhe deu o título e rendeu grande festa no Rio de Janeiro – frente ao também tradicional CSA das Alagoas.

Contudo, não sei porque, mas me veio a certeza repentina que a Série C seria jogada no início da noite do domingo... Essas certezas que tenho repentinamente, que nem eu sei de onde tiro. E, claro, para meu desespero, esperei para confirmar que estava errado: só seria jogada a primeira partida decisiva das quartas de final, entre Juventude e Fortaleza, na segunda-feira, praticamente no mesmo horário de Santa Cruz e Palmeiras, pela série A.

Que restou-me, então? Tempo para pensar...

Tempo para se informar sobre a rápida e dolorosa apuração das eleições municipais 2016. Tempo para se inconformar com resultados arrasadores para as nossas instituições democráticas, já tão combalidas pelo golpe de maio que aniquilou 54 milhões de votos, diante do “sim” de 300.

E eu admito que já imaginava que seria assim! E, óbvio também que esse futebol elitizado (gourmetizado, para usar uma expressão tão em voga) também não passa imune a um processo que cada vez mais afasta o povo.

E eu que queria apenas esquecer. Deixar para segunda, para se indignar. Por isso, precisava de um joguinho despretencioso. E um miserável 0 a 0 já estaria bom. Mas, tive que me contentar com o sorriso milhonário de João Dória Jr., cercado por figuras como Geraldo Alckimin e Fernando Capez.

Quanto à merenda? … Quem lembra? Só a Gaviões da Fiel, que ao deixar o “ópio”, apanha como nunca por insistir em lembrar...

10 comentários:

  1. Abstinência de futebol na TV e overdose de alienação nas urnas.
    Como pode? Até quando as pessoas se deixarão manipular?
    Meu domingo, após o trágico resultado das eleições, foi de reflexão, assim como o seu.
    Nunca na minha vida, me senti tão desamparada politicamente. Já não bastava o governo federal e o estadual, teremos que engolir o Dória como prefeito de São Paulo! Triste e repugnante.
    Seria exagerado dizer, que estamos deixando o Pós-modernismo e voltando para a Idade das trevas ou Período Medieval?

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    1. Caminhos difíceis. Uma sociedade individualista, o extremismo ganha espaço. A democracia perde.

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    2. Uma triste realidade que teremos que enfrentar e combater.

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  2. Pois e´... Eu fico mais com a comparação com o Entreguerras, da primeira metade do século XX.
    Entre a 1ª e a 2ª Guerras, os Estados foram tomados por uma onda totalitária. Fascismos se espalharam.
    O discurso do ódio, da exclusão, levaram à violência generalizada. Nacionalismo e racismo foram as marcas.
    A mesma negação da política, o mesmo discurso hipócrita do que se diz apolítico e se apodera do Estado...
    Trágico mesmo!


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    1. Como ótimo historiador e crítico, acredito que sua comparação tem muito mais fundamento. Meus conhecimentos da História são bem superficiais, não passam muito do aprendido em sala de aula. Usei esse exemplo mais voltado para o período ruim, das trevas, onde a minoria ditava as regras e não na história propriamente dita.

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  3. Conseguiram.
    Acabaram com a beleza de assistir um futebol que dividia as torcidas nas arquibancadas. Onde, nos preparávamos(fisicamente e mentalmente) a semana inteira para assistir um Derby, e imaginar quantos "gomos" de arquibancada cada torcida iria lotar.Era mágico, intrigante e emocionante.
    Agora nos privamos em casa ou bares, para ficarmos de frente ao monitor explorando a nossa angústia e nossos medos, que todo grande jogo nos proporciona. E quando vamos ao estádio, falta aquele calor que sentíamos na antiga "bancada" de cimento.
    Agora sobre a política prefiro me ausentar de comentários, a sociedade hipócrita já me respondeu nas urnas quem é do lado do "mal" e quem é do lado do "bem".
    Triste fim.

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  4. Um misto de solidão, raiva, decepção, frustração e um pouco de medo do que está por vir.
    A única esperança, está nas mãos de vocês, professores! Que inspiram muitos jovens a pensar, a ter senso crítico, a se preocupar com as novas gerações...
    A informação está disponível para quem se interessar, mas a palavra do educador é muito mais convincente.
    Não ouvimos os nossos pais! Ouvimos o professor, os amigos... Ouvimos o mundo!
    Que essa nova geração de jovens pensantes transforme esse país de forma positiva.

    Quanto ao futebol... Independente do que está por trás, das mudanças que ocorreram ao longo dos anos (infelizmente)... Ainda nos traz grandes emoções! Nada melhor do que o pulo e grito de goooool. Energia pura!

    Boa sorte para todos nós!
    Abraços!

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    1. Bom observar seu entusiasmo para com os professores, mas não vejo esse alcance nas mentalidades dos jovens. Ele até existe, mas não nessa dimensão.
      Eu creio que a figura do professor jamais chega aos pés da mídia, essa sim formadora de opiniões entre os jovens e demais membros da sociedade.
      Infelizmente, os resultados últimos da nossa política evidenciam isso.
      No próprio gosto dos brasileiros por futebol essa interferência se faz presente, para exemplificar lanço uma questão: as pessoas no Brasil gostam de futebol ou gostam mesmo da transmissão da tv sobre o futebol?

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    2. Infelizmente você tem razão. Estou indignada! É tão desesperadora a situação do nosso país, que acabei me apegando a um desejo utópico para não perder as esperanças definitivamente.
      Não posso colocar nas mãos dos professores, a responsabilidade de despertar nos jovens o senso crítico ou de torná-los cidadãos conscientes, mas posso torcer para que a maioria deles sejam como você.

      Não saberei responder a sua enquete pelas outras pessoas, só sei que eu amo futebol, seja ele profissional ou de várzea! Nasci praticamente dentro de um campo...rs. Meu pai era presidente de um clube de cidadezinha pequena, minha casa era habitada por jogadores.
      Desde criança ficava com meu ele escutando o jogo do Grêmio pelo rádio, rezando pra conseguir sintonizar na Rádio Gaúcha ou na Guaíba, porque naquele tempo não tinha pay per view. Morávamos em SC e lá, na TV, só passava jogos do Rio. Assisti muita partida em pé (grudada no alambrado), também já fui inúmeras vezes em estádios e prá mim é uma das melhores sensações desse mundo. Não tem preço ver seu time entrar em campo, xingar o juiz, zoar a torcida adversária, escutar os comentários de desconhecidos que se tornam companheiros de sofrimento, que compartilham da mesma paixão que você. Não conseguir ficar sentada, como se de pé ajudasse a empurrar seu time para o ataque.
      Ao vivo, vc não tem replay dos lances, talvez não assista no melhor ângulo, mas não importa porque você está lá!!!
      Não sinto a mesma emoção vendo pela televisão.

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  5. A melhor síntese sobre esse processo de modernização do futebol, tão parecido com o do restante da sociedade, ou seja, que constrói uma capsula em que o falso prevalece. Valeu!

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